15 setembro 2006

Trem de pensamento no redemoinho de Dorothy

Segunda que vem parto para o aconchego da terra natal, e isso gera um verdadeiro redemoinho na minha cabeça. Ironicamente, receio de me sentir totalmente out, não reconhecer a Voluntários da Pátria, confundir o 570 com o 569, o 584 com 583. Qual mesmo o que vai e o que vem? Lembro da lógica, só não sei mais a resposta certa. Vai ter casamento de amigo, vai ter festa de 10 anos de São Vicente, vai ter coisa demais, e eu querendo gravar 5 frases que resumem minha vida e apenas ter que apertar o play. Um fim de semana em Paquetá vai trazer minha infância de volta. São Paulo vai me fazer lembrar do que é estar numa cidade grande. As cigarras do Rio não cantarão mais alto do que os grilos que fazem de Windhoek apenas um grande e organizado vilarejo. Bike-freak que me tornei, fico com pena de pensar que não terei coragem de pedalar pela cidade onde nasci, de ralar os joelhos nos jardinzinhos da General Glicério. Windhoek tá longe de ser uma cidade super bike-friendly, mas com certeza Rio é o ó neste sentido. Fora o medo de assaltos, patota de pivetes, crianças que já não são mais crianças. Daí num trem de pensamento, que me acompanha quando venho pedalando para o trabalho, comparo as crianças “africanas” com as nossas crianças de rua. Penso no acrônimo tão usado por mim diariamente—COVs ou “crianças órfãs e vulneráveis”—e tento criar linhas de comparação. Tento pensar em colaboração, cooperação, aprendizagem, capacitação, palavras usadas de maneira simplista por todos nós, como se fossem fáceis de serem aplicadas. Do pensamento nas crianças pulo para as mulheres sem mobilidade para visitar um hospital ou clínica quando necessário. Penso nas camponesas a 70km de Maputo, penso nas mulheres nas províncias ao norte da Namíbia, penso no nosso sertão, nas comunidades ribeirinhas na Amazônia. Quais são nossas semelhanças, quais são nossas diferenças? Daí dou uma volta e penso nos governos de cá e de lá e em suas (in)capacidades de instaurar políticas públicas decentes. Me emociono com nosso programa de HIV/AIDS ou o orçamento participativo de Porto Alegre dando exemplo. Ruborizo com muito do restante. Voltar ao Brasil, por mais breve que seja, cria um redemoinho interno, minha vontade de férias anulada pelo desejo de procurar um trabalhozinho curto que seja, só pra me inteirar do que se passa. Vontade de saber tudo por inteiro, de saber das verdades e das realidades destes lugares por onde tenho passado. Consciência do impossível.

O mapa do mundo como deve ser. Notas algo de diferente?
Pois comece a desaprender desde já.

2 comentários:

Thata disse...

menina, ler seu blog me faz refletir tanto. é um absurdo sabermos tão pouco sobre o continente africano. Ignoramos nossas origens...que é duma árvore se lhe cortam as raízes? Somos tão semelhantes e tão distantes, né? ooops...acho que embarquei no seu trem de pensamentos! Beijos e boa viagem!

Lucia Malla disse...

Sua disposição para melhorar o mundo é um exemplo para todos. Parabéns! E boa-viagem à terrinha.

PS: Resolvi deixar esse recado pq fiquei muito feliz em saber q vc, com uma experiência admirável, tbm é "filhote" da Voluntários... :)