08 janeiro 2007

De volta de Okathitu.

Pois bem, eu sobrevivi. Melhor do que esperava. Porém, antes confesso que não troco os pequenos luxos de minha vida por nada. Foi um alívio chegar em casa e tomar banho de chuveiro. Cozinhar com luz. Cortar legumes numa tábua de madeira. Ouvir música e assistir filme do Almodóvar no meu computador. Não terminar o jantar e poder guardar os restos na geladeira. Pequenos luxos, grandes luxos, luxos. Ou não luxos. Pode chamar do jeito que quiser. O que importa é que eu gosto da vida que tenho.

Dito isto, volto a afirmar que eu sobrevivi muito bem. Mais do que isso: eu adorei a viagem. Adorei tomar banho de cuia de cócoras. Adorei acabar de vez com minha frescuras com insetos. E aprender a viver no escuro. Adorei ter pés de crocodilo e tentar alisar o calcanhar com pedrinhas simples (quem precisa de Body Shop?). Adorei comer todo o dia praticamente a mesma coisa - oshifima com espinafre - com a mão, lamber os dedos e saber que não é falta de educação. Adorei conversar com tanta gente diferente e aprender a falar pouquinhas coisas em Oshivambo - Walala po meme/tate? Eee. Nawa? Eee. Adorei muitas coisas. Ganhei até galinha de presente (que acabou substituindo a galinha perseguida pela Tila). Visitei a Ruacana Falls, e vi Angola do outro lado do rio. Entrevistei uma penca de gente, fiquei triste/ feliz/ emocionada/ chateada/ chocada com muito do que ouvi. Entendi umas tantas coisas, desentendi outras.

Mas tive momentos ruins também. Numas horas eu queria sair correndo, gritar, pegar um ônibus e vir embora. Não duravam muito meus surtos, e acho que ninguém chegou a perceber. Também tive umas crises do tipo "ah como sou preguiçosa, ah como sou mimadinha, ah como sou city-girl", etc. Eu realmente não tive coragem (qual palavra melhor?) de acordar 5 da manhã pra ir trabalhar no campo. E no meio da tarde eu já estava exaurida, precisando dormir, descansar, ir pra sombra de uma árvore. Mas como dar uma de exausta quando todas as outras mulheres acordaram pelo menos 3 horas antes de mim, botaram a mão na enxada - literalmente -, já cozinharam pelo menos 3 refeições...? Enfim. Crises de existência, eu diria. Mas isso tenho diariamente em qualquer lugar do mundo, não foi exclusividade destas 2 semanas em Okathitu.

Hoje, ao pedalar para o escritório, mil frases me vinham à mente para o blog. Agora claro que encaro minha lista de atividades pendentes e não tenho como sentar e colocar tudo no papel. Tudo poético demais, brega demais, piegas demais. E claro que vai se perder por aí. Mas fazer o quê? Em 10 dias vou novamente para o norte para trabalhar e, portanto, as próximas horas estão todas destinadas a milhões de atividades preparatórias. Tudo na frente do computador, telefone, celular, fax, impressora, música no fundo, roupa limpinha, all star no pé, lanchinho na mochila. Tudo mudérno demais, clean demais, pronto demais. Me assusto ao pensar quantos mundos cabem no mundo.



Um comentário:

Anônimo disse...

Oi linda! Que bom que voce gostou da viagem, apesar da falta de luxos... cara, voce nao eh fresca nao viu, fica tranquila. Eu te acharia louca se voce tivesse ido trabalhar no campo (e as mulheres de la tambem, provavelmente). Penso bastante em voce aqui em Londres. Que vida diferente, ne? Depois te escrevo um email. Beijao!