Inspirada-pirada

Domingo. 10 da noite. Hoje a Julia completa 7 meses. Inimaginável. E eu já sinto saudades dela bebezinha, do chorar no meio da madrugada, dos dias de delírio que se passaram ao parto. Não lembro mais de como doíam os peitos e das minhas olheiras e do cansaço. Julia completa 7 meses e tudo que eu quero são nossos diálogos mamamama, a-bu-a-bububu, dadadada; nossas leituras antes de dormir; nossas risadas na frente do espelho. Esta semana aprendeu a fazer tchauzinho, e a cada tentativa para coordenar o movimento da mãozinha eu tenho vontade de apertá-la de tanto amor. Vê-la crescer me inspira.

Mas o trabalho volta com força, e me pede atenção, e eu dou a tal da atenção porque eu adoro e senão como poderia reclamar da vida corrida? Me envolvo cada vez mais com questões de acesso a saúde (ou falta de…), e como transporte tem um papel crucial no dia-a-dia das pessoas. Coisa séria, coisa que pira, coisa que assusta, coisa que inspira, coisa que exige um concentrar que só mesmo nas manhãs gélidas, com uma caneca de café bem quente. E assim – tá tudo se expadindo. De repente, o financiamento necessário ao que fazemos, à nossa vida, às nossas escolhas, é algo tangível. Mas as dificuldades não cessam. Para caminhar, precisamos de gente capacitada, de namibianos que tenham empenho e foco, e que levem tudo adiante. Semana passada tivemos 2 dias de planejamento estratégico. Nada de blahblahblah - tudo muito bacana, a tentativa de colocar sonho em pauta. E olha que quanta surpresa boa… difícil explicar aqui… só mesmo com muitas reticências (mas eu até que normalmente tento evitá-las). Deixa agora eu tomar um gole do meu chá roiboos. Pronto. Agora te digo. É tudo muito gratificante. Não que eu esteja querendo me gabar (ok, admito que é mesmo o que estou fazendo). Mas é que é tudo a prova de que podemos ampliar o trabalho de forma sustentável, com a dedicação necessária, alcançando o que às vezes parece inalcançável. Definitivamente, uma outra fonte de inspiração para minha vida mundana.

(Me inspira também o Sandman que comprei em Melbourne. Pequenos luxos básicos ao ser. Sabe o que mais me inspira? Geléia geral e Hélio Oiticica, mas faz tempo que não me deleito com os tais. E pernocas porto-alegrenses. E receber cartas de amigos queridos (ei ei ei!). E ser musa (mas aceitar ser apenas uma delas). E saber de amigas queridíssimas grávidas. E e-mails políticos de amigos inteligentes. E músicas namibianas, zimbabueanas, moçambicanas. E cozinhar gema de ovo pra Julia. E no café da manhã, preparar maçã com tapioca (que ela adora). E ler John Holt pra saber mais sobre como se aprende).

Agora, na boa. Se eu pudesse recomendar apenas uma coisa para todos que eu conheço, recomendaria assim: vá para outro país pelo menos por um tempo. De preferência, vá para um lugar inesperado, com uma cultura outra, com um cheiro diferente, com uma realidade que só mesmo vivendo pra aprender. Caminhe, pô. Faça sonho virar passagem.

(Fora isso, recomendaria tudo mesmo que é politicamente correto—por que hoje acordei verde, com vontade de nunca mais me entupir de big mac, e com um senso propagandístico-besta. Portanto, não use sacolas de plástico, recicle o lixo, use lixo orgânico como adubo, não puxe a descarga quando fizer xixi, lave a louça no estilo bacias, tenha uma horta em casa, use fraldas de pano, troque todas as lâmpadas da sua casa pelas econômicas, ligue a tv apenas pra assistir dvds—ou mesmo não tenha tv. Parece difícil e distante? Né não… acredite. A gente sempre fez tudo isso aqui, e muito mais, e te digo é coisa banal, diária, e diria até mesmo óbvia).

Ufa. Pronto. Agora me vou.
Acho que o vinho me subiu a cabeça ;-)